Especialistas discutem o futuro das usinas híbridas no Brasil em novo episódio do ABSOLAR Inside


Em linha com a modernização do setor elétrico, o ABSOLAR Inside de maio trouxe as últimas novidades de usinas híbridas, além de suas vantagens e futuro no Brasil. No programa digital ao vivo, especialistas ainda ressaltaram a importância das energias renováveis. O episódio foi ao ar no dia 27 de maio de 2021, com a apresentação da jornalista Priscila Brandão. Ao lado dela, o âncora e conselheiro da ABSOLAR, Diego Bittner, conversou com os convidados Sandro Yamamoto, Diretor técnico da ABEEólica; Dorel Soares Ramos, sócio administrador da MRTS Consultoria; e Brandon Fitchett, program manager de P&D em energia eólica da Electric Power Research Institute (EPRI). O ABSOLAR Inside também contou com a presença dos parceiros Carolina Reis, diretora comercial do Meu Financiamento Solar; Rafael Puglia, sócio fundador da Vendemmia Logística Integrada; e Rodolfo Meyer, CEO do Portal Solar.

Confira abaixo o resumo de tudo o que aconteceu nesse episódio:

Sinergia entre energia solar e eólica


De acordo com Sandro Yamamoto, a energia eólica tem se desenvolvido de forma intensa, com ampla geração de empregos. “Temos 18,7 GW de capacidade instalada abastecendo 12% a 13% do sistema interligado nacional”, disse. O diretor técnico da ABEEólica, destacou que o Brasil foi o terceiro país do mundo que mais instalou usinas eólicas em 2020, perdendo apenas para Estados Unidos e China. Atualmente, estamos em sétimo lugar em capacidade instalada total. “Para os próximos quatro anos, há mais de 10 GW a serem instalados, aumentando em 30% o que já está instalado hoje”, informa. Nos últimos anos, a fonte tem se desenvolvido muito por meio do mercado livre. Segundo Yamamoto, a eólica começou vendendo projetos em leilões organizados pelo Governo Federal e agora grandes consumidores encontraram forma de comprar energia eólica competitiva.

Para um panorama geral, Diego Bittner explicou que um projeto híbrido consiste na combinação de duas ou mais fontes, próximas ou até no mesmo terreno, aproveitando a mesma infraestrutura para injetar energia. Na região Nordeste, principalmente, o grande potencial das fontes solar fotovoltaica e eólica faz com que ambas trabalhem de forma complementar. A sinergia entre as fontes pode otimizar o uso da infraestrutura de transmissão. “Os ganhos de otimização podem acontecer na própria infraestrutura da rede, na logística da construção de projetos, bem como em encargos atrelados à logística de transmissão”, disse. De acordo com o âncora do ABSOLAR Inside, os mais de 18 GW instalados em eólica poderiam ser transformados em potência para a inserção de usinas solares, tornando-se uma relação “ganha-ganha”.

Hibridismo traz benefícios para geradores e modernização do setor elétrico


Para Diego Bittner, encargos são destaques. Empreendimentos em um mesmo terreno são hoje olhados de forma individualizada, com cada projeto tendo que cobrir seus custos e o próprio encargo de transmissão tem que contemplar a potência total de cada usina. Como as usinas não gerariam a totalidade da potência em tempo integral, o empreendedor conseguiria reduzir custos, o que se traduz em energia mais barata. “O custo de encargo durante a operação das centrais é extremamente relevante. Há outras vantagens, como aproveitar a infraestrutura da rede, no qual mais de um projeto se beneficia de uma mesma rede”, informa.

Sandro Yamamoto dá o exemplo de um projeto instalado de eólica, que não gera 100% da sua capacidade: há momentos em que a geração é menor e a infraestrutura de transmissão tem espaço para escoar mais energia. Em um projeto solar com eólico, no qual a energia de cada fonte é gerada em momentos diferentes, pode usar a mesma infraestrutura. O benefício da economia também se reflete nos custos para o consumidor.

Primeiro projeto híbrido é aprovado pela Aneel


De acordo com o âncora do ABSOLAR Inside, o primeiro projeto híbrido do País é marco importante, atrelado à consulta pública a ser aberta em algumas semanas pela Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) sobre o tema.

O projeto piloto é importante para destravar possíveis dúvidas de operacionalização, uma vez que requerem alterações regulatórias. Tecnicamente falando, é possível que a soma de geração de projetos possa coincidir, então a necessidade de corte de energia terá que ser respondida. Ainda, a Enel requereu, à Aneel, a operacionalização de um projeto piloto híbrido no Piauí de 250 MW”, explica.

Sandro comentou que, durante a reunião da diretoria da Aneel em que o projeto piloto foi aprovado, a área técnica da agência fez uma apresentação sobre o projeto híbrido. Espera-se que, de agora em diante, mais projetos sejam implementados.

Aperfeiçoamentos regulatórios: qual é o mais importante para destravar o desenvolvimento da modalidade no Brasil?


Segundo Dorel Soares Ramos, os aspectos mais relevantes são os que estão associados à complementaridade de área, como as áreas com ventos alísios de geração noturna. “O sistema de escoamento, quando pautado pelo máximo de geração da fonte eólica à noite, ficaria ocioso durante o dia e a fonte solar pode pegar carona com a geração diurna”, disse.

Para o sócio administrador da MRTS Consultoria, há sinergias que podem ser aproveitadas, como o compartilhamento de terreno, subestação, casa de comando, bem como operação e manutenção. No entanto, isso não é suficiente para a justificativa econômica dos projetos. Por isso, o mais importante para destravar a modalidade é o Montante de Uso do Sistema de Transmissão (MUST), ou seja, o volume de contratação de potência do sistema de escoamento. Isso custa e afeta a viabilidade do projeto e a ideia é permitir que a regulação traga a possibilidade do gerador definir qual será o montante contratado.

A ideia também, é que a instalação de equipamentos de corte automático de geração deveria ser deixada para a definição do agente, com supervisão do Operador Nacional do Sistema Elétrico (ONS). “Um terceiro aspecto importante, é a questão da garantia física. Atualmente, não há critério definido. No caso de solar o critério é o P50 (50% da chance de produzir o valor menor) e eólica tem o critério mais restritivo de P90 (10% de chance de produzir o valor menor). A usina híbrida provavelmente seguirá o P90”, informa.

Segundo Dorel, o aspecto que demanda regulação é o armazenamento, que pode minimizar cortes automáticos, que de outra forma seriam necessários, aprimorando a garantia física.

Estudo da ABSOLAR, ABEEólica e APINE apresenta os desafios de usinas híbridas


Sandro Yamamoto informou que, para finalizar o estudo de 2019, o trabalho com a MRTS durou um bom tempo, uma vez que foi necessário estudar os perfis de vento e sol em diversas regiões. “O estudo mostrou quão benéfico é para o país unir as fontes e criar regras para viabilização desses projetos. Hoje se fala de eólica e solar, mas podem migrar para outras fontes”, disse.

Diego finaliza dizendo que o estudo foi um marco importante. Vários dos pontos que precisavam ser regulamentados foram capturados no estudo e serviram como base para discussão e encaminhamentos da Aneel, para a consulta pública. “O consenso foi construído entre as três associações para destravar negócios, mostrando que todos estão remando para a mesma direção e a Agência tem acatado esses pontos”, informou.

Principais possibilidades de hibridismos, situação nos EUA, desafios e aprendizados


Brandon Fitchett comentou sobre o crescimento do armazenamento nos Estados Unidos. Atualmente, são 5 GW de baterias conectadas à rede, sendo que a maioria delas está em construção e em fase de instalação em 2021. No Texas, pode-se encontrar a fonte eólica com armazenamento e, em regiões onde há incentivos tributários, encontra-se a fonte solar fotovoltaica com armazenamento. Também, há mais de 20 GW em hidrelétricas reversíveis.

“Há empresas especulando sobre cenários para armazenamento. Uma vez que o armazenamento reduz a perda de valor de eletricidade”, disse. Segundo Fitchett, o armazenamento pode auxiliar em dois pontos:
1) na coincidência de geração entre as duas fontes e escoar a energia posteriormente; e
2) o gerenciamento de energia para alocação em melhor período de interesse do consumidor, o que se torna mais relevante com a entrada do preço horário.
“O armazenamento tem seu custo sendo reduzido e precisamos buscar outros negócios, além da gestão de projetos híbridos, atrelar baterias a serviços ancilares pode ser mais atrativo”.

Sandro complementou dizendo que o armazenamento será fundamental no médio e longo prazos. Hidrelétricas conseguem armazenar energia por um longo tempo em reservatórios e baterias são utilizadas para períodos mais curtos, para atender ao que o consumidor precisa. “Pode ser que, em alguns momentos, sol e eólica tenham queda, assim, as baterias podem armazenar energia para compensar nestes momentos”, informou.

Principais dúvidas dos espectadores são respondidas pelos convidados


Durante o ABSOLAR Inside, a jornalista Priscila Brandão abriu espaço para uma mesa redonda com os parceiros do programa, e para que os convidados respondessem algumas das perguntas dos espectadores. Confira:

A hibridização dos projetos solares e eólicos existentes pode ser a solução para evitar as restrições operacionais causadas de falta de margem de escoamento em diversos pontos do sistema?

Sandro Yamamoto: atualmente, o sistema de transmissão tem várias subestações com pouca margem de conexão de novos projetos. No entanto, se considerarmos projetos híbridos, há espaço para conectar projetos solares onde há eólicos e vice-versa. Há metodologia de margem de escoamento. Podemos evoluir nesses cálculos e subestações com margem zero podem ter viabilidade para receber projetos híbridos. Mas é necessário a realização de mais estudos e linhas de transmissão para a conexão de todos os projetos.

Como são vistas as diferenças entre os projetos de geração centralizada, especificamente para projetos híbridos, e de geração distribuída sob o ponto de vista de financiamento?

Carolina Reis: a diferença é o porte, pois um projeto pequeno tem risco menor. São processos distintos de análise de crédito, projetos grandes têm procedimento de financiamento pela área corporativa do banco, que atua em ambos os segmentos, e não pela plataforma Meu Financiamento Solar para geração distribuída.

Qual o potencial de desenvolvimento de usinas híbridas no Brasil?

Rodolfo Meyer: o potencial é pleno e inevitável. Não há outra opção ao longo prazo além de hibridizar projetos, considerando a mitigação de oferta de fonte em horários específicos. Híbrido entre solar, eólica e armazenamento tende a regular escoamento ao fio, chegaremos ao objetivo de casar oferta com a demanda. Já para o lado da geração distribuída, a questão está na certificação de inversores híbridos.

Como tem visto as novas oportunidades e desafios trazidos pelos projetos híbridos, sob o ponto de vista logístico?

Rafael Puglia: a Vendemmia é uma empresa de logística e a complexidade para planta solar ou hibrida é muito grande. Pelo porte ou localidade, a logística tem impacto financeiro forte no projeto. Além de desafios regulatórios e logísticos, há sinergia logística e operacional natural. Equipamentos com um único destino reduzem o custo do projeto. Equipes e equipamentos serão compartilhados também. Há muita possibilidade de economia nesses projetos.

 

A primeira usina hibrida paga dois “encargos de uso do sistema de transmissão” separados?

Diego Bittner: hoje, com a regulamentação não aprovada, o pagamento é segregado. Cada um paga 100% da potência de seu empreendimento. Com o hibridismo, a ideia é que seja aproveitado. Entende-se que com o projeto aprovado não precisará pagar encargo adicional, o acoplamento se dá sem custo adicional.

Sandro Yamamoto: não há custo adicional, sendo que essa é a proposta do setor.

A questão cambial pode impactar o desenvolvimento dos primeiros projetos híbridos no Brasil?

Rafael Puglia: a variação cambial impacta qualquer grande projeto de infraestrutura. A alta do dólar gerou a postergação de investimentos e há a busca pelo timing perfeito da moeda para continuar a investir.

Existem planos de desenvolver plataformas análogas para projetos de geração centralizada?

Carolina Reis: ainda não, por conta de características específicas desses projetos. O contato ainda tem que ser feito direto para análise.

As usinas híbridas de grande porte vêm sendo discutidas pela Aneel, mas ainda não há projetos em operação. No caso da geração distribuída, tem espaço para o avanço desse tipo de projeto no futuro?

Rodolfo Meyer: a única coisa que impede é a regulamentação, falta de framework legal. Atualmente, há sistemas com bateria vendidos como se fossem off-grid. Mesmo com conexão, tem sistema de ilhamento. Dependemos dessa liberação por parte do Inmetro, mas a maioria dos distribuidores estão prontos.

Caberia aplicar o excesso de produção de energia da planta híbrida com armazenamento em baterias?

Sandro Yamamoto: sim, com sistemas de armazenamento o excesso pode ser colocado na bateria, sem desperdiçar essa energia, podendo colocá-la de volta na rede depois.

Quando os financiamentos do Banco BV podem abrir condições para as empresas integradoras que ainda não possuem três instalações (projetos concluídos) necessárias para a adesão ao financiamento ao cliente?

Carolina Reis: o critério é para minimizar riscos, dada a grande entrada de empresas. Mas é necessário analisar caso a caso.

Além da hibridização entre solar e eólica, como está avançando a regulamentação da hibridização entre essas fontes e hidrelétricas, em especial no momento atual de baixa capacidade nos reservatórios?

Diego Bittner: a regulamentação que está sendo discutida não restringe para nenhuma fonte. Um exemplo é o projeto de P&D, em Sobradinho, que tem estudado solar flutuante. A ideia é aproveitar a localização e infraestrutura de rede. Recentemente nos Estados Unidos, a Enel inaugurou uma geotérmica com solar fotovoltaica.

Como as discussões do marco legal da geração distribuída que estão acontecendo no Congresso podem afetar esses projetos?

Rodolfo Meyer: é uma grande incerteza do setor. De um lado, temos a proposta da Aneel, que por partes não está sendo bem-vista. Do outro, o marco legal traz condição mais coerentes com a transição da solar fotovoltaica na matriz, com queda gradativa de subsídios. O projeto de lei nos parece mais ponderado e acreditamos que a proposta deve garantir a transição. Já a proposta da Aneel traz queda muito brusca de transição para investidores.

Como funciona a logística de baterias para projetos híbridos?

Rafael Puglia: a logística de baterias é um pouco complexa, considerando a classificação de produtos com risco e, consequentemente, custo maior do que produtos sem esse risco. A certificação e homologação também é burocrática. Terceiro ponto é o descarte, desde 2010 há uma política nacional de resíduos sólidos para que produtos sejam corretamente descartados.

No caso de financiamento para usinas híbridas, muda algo no processo?

Carolina Reis: projetos de solar fotovoltaica têm riscos específicos de performance e segurança do local. O projeto híbrido, se tiver bateria, incluirá mais variáveis. Mas, da perspectiva técnica, o processo é o mesmo. Hoje financiamos qualquer porte de projeto.